terça-feira, 28 de abril de 2009

Paladar




Eu não devia ter aceitado esse convite, que cilada acreditar no zodíaco. Que loucura acreditar que você vai mudar. Por que disso? Estamos sentados frente a frente a quase cinquenta minutos e nossa conversa não durou mais que um cigarro, enquanto o silêncio já consumiu meio maço. Eu não sei ler o que você não diz, e a única coisa que você disse até agora é que pelo visto choverá mais tarde. Nem notou que pintei os cabelos. Tento puxar um assunto, pergunto se ainda tem a velha mania de dormir de meias e você apenas balança a cabeça como quem diz sim. Quero saber se você já tem outra. Ou antes disso: saber por que me chamou para vir até aqui. Por que escolheu logo esse lugar? Qual a sua intenção me trazendo de volta a esse passado? É sexo que desejas? Deveria ter me levado a um motel, mas a verdade é que você é incapaz de me proporcionar todo esse calor que agora consumo numa xícara. Você só pensa em si, e a verdade mesmo é que isso pouco me importa. Te quero. Tudo que desejo nesse momento é ter coragem para lhe dizer que se ainda quiser, sou toda sua. O amor me humilha e me ilude. Quando o meu telefone tocou passei a imaginar que era hoje que iríamos nos acertar. Errei. Você não mudou, eu não te esqueci. Se você ao menos soubesse ler o meu olhar ia perceber o quanto invejo aquele casal feliz da mesa ao lado. Talvez isso lhe causasse alguma comoção. Porque o amor me humilha e eu me contento com pouco. Acabo aceitando suas palavras mudas e seu sexo frio. Aceito restos e dejetos. Aceito todos os convites que me fizer para voltar aqui. Aceito café sem açúcar e me entrego por inteira a você sem sal.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Ser

Ser desprezada, ignorada, tratada com indiferença. Com uma completa cara-de-pau. Quero te deixar livre. Livre. Que tipo de amor é esse? O que a consome agora? Eu te amo. A decepção cega. Impossível acreditar em qualquer mentira. Até nas verdadeiras.

Gosto de me sentir entorpecida. De não me sentir. Anestesiar meus sentidos, à procura de momentos de vazio. O confortante nada. O quarto, antes todo preenchido, agora é só eco e escuridão. Ouço-me, numa repetição infinita e circular, que teima em me amedrontar. Em assombrar.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Aspas

Um dia, quando eu era pequeno, sem querer entrei no banheiro feminino. Que vergonha que eu fiquei, sai correndo e me tranquei no armário!

(Fecha aspas)

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Conto de Fadas


ali, vivem os apaixonados - dirão os terráqueos.


Vou te levar pra morar na Lua. Viveremos só de amor. Materemos a sede através de carinhos sinceros e abençoados - a fonte que brota meus sentimentos não irá se secar. Vou matar sua fome e saciar minha vontade - nos alimentaremos de sexo, assim como seu ventre se alimentará do meu gozo. No lugar do vinho, vamos nos embriagar de beijos molhados e ardentes. Minha boca há de apreciar cada golada que tens a me oferecer - estarei constantemente bêbado!

Na Lua, andaremos pelados, iguais a Adão e Eva, sem ter roupa suja pra lavar. Seremos vizinhos de Jorge e nosso animal de estimação sera um Dragão. Do nosso quintal avistaremos a Muralha da China e toda a Via Lactéa. Planteremos estrelas no jardim e criaremos uma constelação de filhos!

Vamos embora para a Lua. Lá seremos amigos do rei Sol. Serei seu príncipe encantado e serás a dona dos meus pensamentos. Meu cavalo branco será um cometa em chamas e nosso castelo feito de meteoritos. Seremos enfeitiçados por uma bruxa boa. Não haverá o dia e a noite, nem o ontem e o amanhã. Seremos eternos amantes, predestinados a um final feliz. Felizes para todo o sempre. E fim!

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Cores, flores, amores.


Hoje vou te reinventar dentro de mim. Te pôr a limpo num papel novo e amar diferente tudo outra vez. Porque me canso de ser todo dia sim e me torno um não. Vou te reescrever numa cor diferente, talvez um vermelho tão intenso quanto os sentimentos que carrego. Darei toques de verde escuro pra que cuidem do nosso futuro com muita esperança.
Quero te refazer sempre, pra não deixar que nada envelheça e perigue morrer. Vou te desmontar e remontar várias vezes, numa ordem diferente, sem faltar pedaços. Quero tudo que você tem, mas às vezes você pode ser sim, e deixar um pouco de ser não. Vou te entregar meu amor reciclado. O mesmo que nasceu numa semana de afinidades. Reciclei esse amor pra te dar de presente, tirei o que já estava gasto e juntei mais pedaços de vida nele.
Hoje vou te reinventar dentro de mim. Não que eu precise de outro amor, mas é que eu preciso saber que as coisas saem sempre do lugar, e que mesmo o meu amor, apesar de seguro, às vezes precisa brincar de ser outro. Assim como nós dois às vezes brincamos de nos odiar, sabendo que o ódio não existe. Assim como nós dois às vezes brincamos com as palavras e acabamos nos ferindo, mesmo sabendo que o que sai da boca, nem sempre vem do coração.
Meu amor, prometo cores, flores e amores pra nova vida. Que os nossos novos eus sorriam muito mais que hoje e ontem. Vou comprar muita tinta, vou estender um arco-íris pra você passar. Vou dar vida aos nossos novos caminhos, que já se adiantaram a nós. Vou te amarrar uma cordinha pra você não se perder, e vou soltar quando você pedir pra caminhar um pouco mais.
Esse é o nosso mundo novo, num amor reinventado. Agora corre, que ainda existem muitas páginas antes de terminar este capítulo e muita tinta, muita cor pra viver.

domingo, 12 de abril de 2009

Godê

O que eu vejo, ninguém mais vê. Assim como o que você vê, ninguém mais vê. Nem eu. Meu avô é que gostava de falar 'Eu vi, com esses dois olhos que a terra há de comer'. Ela que não perca tempo com os meus. O que eles têm de gostoso ela não come. O que vi pelo caminho vai comigo, ainda que eu não saiba pra onde. Todos os tons do verde, azul e vermelho, e as n combinações entre elas a terra não come. Marrom de terra, de bolo de chocolate, de café na mesa, de violão desafinado, não come. O branco da sua cueca não lhe abre o apetite. E falando nisso, poucas as vezes que te vi usando cuecas de cores fortes, como o roxo. Roxo mesmo só na gravata que usou no casamento da sua irmã, que se casou de branco. Branco igual suas cuecas. Mas isso é outro assunto.

Pra terra, verde falta tempero. Verde da embalagem de Sazon, do cheiro de mato, verde maconha, verde bandeira, verde da quase extinta nota de um real. Talvez o verde dos seus olhos ela goste. O amarelo do seu cabelo ela não gosta. Nem do amarelo de sol, da cerveja e de alguns sorrissos. Aquele jardim todo colorido lhe enjôa. Só não sei falar extamente que cores eram porque, pra falar a verdade, quando estou com você não tenho olhos para mais nada. Já quase bati o carro porque não notei o vermelho do semafaro. Não enxergo nada, nem o vermelho do semafaro nem o do eslmalte da mulata. Nem da roupa da vitrine, do batom, nadinha.

Ainda tem o tempo. Esse é que não enxergo mesmo. É so deitar no seu colo. Ele pode passar em rosa choque que eu não vejo. E é ai que me fica a dúvida: será que a sete palmos do chão, quando a terra comer meus dois olhos, vou ver qual o tom o tempo tem?

sábado, 4 de abril de 2009

Janeiro

O Pão de Açucar, o Corcovado, suas nádegas. Deslubrantes, os três - fascínio. Tu és meu Rio de Janeiro. Doce lembrança salgada de mar. Te fiz canção em Vila Isabel. No arpoadoar, fantasia - arrepios. Em Ipanema pensava em casamento. Teus pés descalços, seus braços fortes e um pensamento louco na minha cabeça - ilusão. Na Lapa fui turista - vadia - eras sonho. No quarto do hotel - memória - o espelho refletia suas sombrancelhas gulosas e seu corpo luxúria. Você de pernas abertas, o Cristo de braços abertos - paixão. Meus olhos bem abertos, sua boca quente, nosso suor ofegante. Ali, me fez grande - tristeza. Era o começo do fim. Melhor se fosse o fim do começo. Eras, ao mesmo tempo, o cigarro queimando e a fumaça que escapava aos lábios. Eras o bronze que me saltava a pele e o frio que me esperava lá em casa. Eras manhã de Sol e ontem. Eras castelo de areia e o vento. Eras ressurreição e morte. Hoje tu és recordação, fotografias - saudade. És a proxima estação. És o verão em outro continente. Peço sempre a Nossa Senhora de Copacabana para tê-lo de volta, eternamente -amor. Em silêncio, enquanto rezo, peço também que as estrelas te mandem um beijo. Um só, igualzinho ao sentimento que me despertou naquela cama, único.

Prazer em conhecê-lo.